segunda-feira, 7 de maio de 2012

Quando aprendi a brincar de boneca

Gente... faz tempo né? Ausência total de criatividade!!!Bom.... mas, agora vou tentar voltar com tudo e pra brindar este retorno, divido com vocês o texto que eu fiz para o Concurso "Ação & Expressão" da Reiyukai. Torçam por mim, tá?Beijos


Uma experiência que mudou minha vida

Lembro-me perfeitamente do dia em que as coisas mudaram. Eu era uma menina como tantas outras, com as lições de escola e as brincadeiras de rua sendo as principais atividades. Tinha também um quarto só meu, cheio de livros, jogos e bonecas. Na medida do possível, não me faltava nada e eu, bem sabia, tinha pais capazes de tudo para me verem feliz.
Foi quando, de repente, eles me deixaram na casa de um vizinho. Eu não gostava dele. Era bravo e brigava por tudo. A mulher dele, no entanto, era bastante carinhosa e me dizia pra ficar calma porque meus pais me trariam uma deliciosa surpresa.
Tal surpresa chegou não sei precisar quanto tempo depois. Era uma boneca linda. Papai me disse que ela, na verdade, era um menino e que eu ainda não podia brincar com ele. Mamãe me disse que o boneco precisava que eu ficasse bem quietinha e que eu teria que ter paciência para só depois segurá-lo no colo.
Apesar de todas as regras, não fiquei chateada. Meu boneco era lindo demais e meu maior prazer era ficar ali, só olhando ele dormir. Aprendi a esperar.
Tempos depois, cai de bicicleta e fiquei com o nariz todo machucado. Era uma ferida enorme e horrorosa e minha mãe me obrigou a ir para escola assim mesmo. Esta foi a primeira vez que aprendi a me defender sozinha. Aprendi a deixar claro que eu mereço, no mínimo, respeito.
Quando minha família se mudou para o interior, a casa em que a gente morava ficava num bairro novo; só havia nós e nada mais. Passava o dia sozinha. Aprendi que conversar com o espelho é a melhor maneira de me conhecer.
Na juventude, descobri que o primeiro amor pode não ser o único e que, gostar de quem não gosta da gente, machuca e dói de verdade. Aprendi que não devo chorar por quem não valha à pena.
Aos 18 anos entrei na faculdade. Escolhi Jornalismo e descobri que tudo na vida tem dois lados e a minha opinião sozinha é muito pouco para comprovar qualquer coisa. Aprendi que eu sempre posso saber mais.
Também nesta fase, conheci os amigos que eu levaria para o resto da minha vida comigo. Muitos que, hoje, quase pouco vejo, outros que ainda fazem do meu dia, um dia melhor. Aprendi que amizade de verdade é sinônimo de querer bem e nada mais. Se alguém te exige alguma coisa, melhor virar a página.
Entre tantos amigos conquistados, teve também aqueles que me abandonaram pelo caminho. Pessoas queridas que hoje me tratam como estranha. Aprendi que não estou livre da decepção, mas ter do que recordar é melhor do que não viver.
Tive ainda que lidar com a dor da morte. Perdi meu pai aos 21 anos. Julguei Deus. Briguei comigo, culpei uma porção de gente. Descobri que nada mudou diante da minha perda. Aprendi que pouca gente vai se importar com os meus sentimentos e que o mundo não para só porque eu preciso chorar mais um pouquinho.
Sozinhos, minha mãe, meu irmão e eu aprendemos a ser família de novo e fomos em diante, juntos e sempre. Aprendi que posso ir pra onde quiser, mas vou mais longe quando sei que posso voltar.
Nesta fase tão triste da minha vida, eu já tinha do meu lado alguém pra me dar forças. Quando conheci meu marido, minha vida mais uma vez se abriu para novas oportunidades. Ele segurou minha mão no momento em que eu mais precisei e só por isto serei eternamente grata.
Amei como nunca pensei que fosse capaz de amar um estranho. De repente, tudo que era meu virou dois e eu só me senti feliz por dividir. Aprendi que, se nem sempre estou certa, vai ter sempre alguém para me perdoar.
Quando decidimos nos casar, passei também pela fase da ansiedade por deixar de ser filha para me transformar em esposa. Em nenhum momento, no entanto, senti qualquer medo. Aprendi que quando tem amor, a vida se encaminha e encontra o rumo certo.
Ainda nos tempos de casamento, mais uma cena me vem à cabeça e me lembro do meu boneco tão querido e tão amado. Quando me casei, enquanto a porta da igreja estava fechada e eu me programava pra entrar, senti muita vontade de chorar. Em parte, de alegria porque estava realizando um sonho. Outra parte por puro nervosismo. Outra ainda por uma mistura de saudades e tristeza: eu não tinha meu pai ali e estava deixando de dividir meu quarto com a melhor pessoa do mundo, minha mãe.
Meu boneco, meu brinquedo predileto, o bem mais precioso que ganhei dos meus pais, estava ali do meu lado e com um só olhar entendeu tudo que se passava dentro da minha alma. Ele apertou minha mão e disse “não chora, vai dar tudo certo”.
Assim, quando questionada sobre uma experiência marcante, não posso deixar de dizer que muitos episódios importantes aconteceram nestes 30 anos. Aprendi a ser filha, ser amiga, esposa, nora, cunhada. Vi a transformação de menina para mulher; de estudante para trabalhadora. Vi meus sonhos serem modificados. Levei muito tombo e aprendi que levantar tem um sabor delicioso.
Hoje sou uma mistura de muitas influências e inúmeros acontecimentos. Mas, sem sombra de dúvida minha vida mudou quando ganhei meu boneco. Foi ele quem sempre esteve comigo o tempo todo. Só ele entendeu toda a história sob o mesmo ponto de vista que o meu.
Com ele eu pude rir a vontade. Pude ter medo do escuro. Andei de bicicleta, brinquei de casinha. Falei palavrão e palavras de carinho com a mesma intensidade. Planejei fugir de casa. Caí na balada. Enchi a cara. Comecei a dirigir. Comi mingau de aveia e chocolate até estourar.
Meu boneco me fez ver que a gente pode chorar de saudade, de dor. Também de ódio e de raiva. Mas, sobretudo, de amor e orgulho. Foi meu boneco quem me ensinou a olhar para frente, mas sem esquecer de olhar para o lado.
Por isto, não há dúvidas! De todas as experiências que tive, a mais importante aconteceu em 07 de agosto de 1986, quando ganhei meu boneco: o meu irmão Ygor, que chegou tão pequenininho e fez minha vida grandiosa. Ele me ensinou a amar, aprender e confiar sempre, porque tudo “vai dar certo”.

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